Sobre o sistema de cotas na universidades
Caros apresentadores, Jonas e Nino:
Durante essa semana, através do seu programa, o qual é transmitido diariamente pela nossa Rádio Capibaribe, 1240 am, ouvi, com bastante indignação, suas críticas ferrenhas a respeito da decisão do STF sobre a manutenção do sistema de cotas nas universidades brasileiras. No mesmo momento, pensei em ligar e demonstrar, ainda no ar, toda a minha decepção com a sua postura insensata, pois, de certa forma, confesso que esperava mais de vocês, Jonas e Nino, principalmente , quando o programa de vocês se chama “ A verdade do Povo”.
Durante essa semana, através do seu programa, o qual é transmitido diariamente pela nossa Rádio Capibaribe, 1240 am, ouvi, com bastante indignação, suas críticas ferrenhas a respeito da decisão do STF sobre a manutenção do sistema de cotas nas universidades brasileiras. No mesmo momento, pensei em ligar e demonstrar, ainda no ar, toda a minha decepção com a sua postura insensata, pois, de certa forma, confesso que esperava mais de vocês, Jonas e Nino, principalmente , quando o programa de vocês se chama “ A verdade do Povo”.
Como
todos sabemos, os negros eram pessoas livres em seus países de origem. Muitos,
inclusive, ocupavem cargos no alto escalão.
Até que um dia, eles foram brutalmente
arrancados de sua pátria ( ou terão
sido raptados? ) e conduzidos e obrigados a viverem em lugares distantes e
desconhecidos. O objetivo dessa atitude brutal e desumana não era outro senão o
de escravizar os negros e obrigá-los a trabalhar de graça para seus “donos”, a
fim de que esses “senhores” enriquecessem
cada vez mais. Tudo isso à luz de
uma legalidade hipócrita, com o apoio ou omissão ou submissão da Santa Igreja. Os negros eram impedidos a
entrarem nos templos alegando que eles sequer tinham alma.
Pois bem, Jonas e Nino,
esse verdadeiro crime contra a humanidade durou séculos no nosso país, e só
concordamos com a libertação dos negros escravizados ( escravizados, sim, porque
na verdade eles nunca foram escravos, mas seres humanos forçados a trabalhar de graça), devido a pressões exercidadas pela comunidade internacional.
Contudo, isso era de se
esperar, como hoje, os exploradores
tiveram dificuldades em abrir mão de suas mordomias e resistiram o máximo que
puderam para evitar a liberdade dos negros. Ao contrário dos filhos dos escravizados, os
filhos dos senhores sempre puderam estudar nos melhores colégios e nas melhores
universidades. Os nomes da família, como ainda hoje é assim, abriam as portas do sistema como garantia de que o
poder sempre estivesse nas mãos daquelas
famílias tradicionais. Mudar, para quê?
Afinal, em time que está ganhando não se mexe, não é mesmo?
Os negros, enfim, foram
libertos. Mas, e os seus direitos? O que eles poderiam fazer com aquela tal “liberdade”, se não sabiam ler nem
escrever e não sabiam fazer outra coisa a não ser trabalhar nas lavouras e nas
cozinhas das sinhás? Muitos deles se aventuraram pelo interior do país, nos quilombos, em busca por
sobrevivência, longe daquela exploração e das crueldades praticadas pelos seus “antigos donos”, os quais poderiam, inclusive,
dispor de suas vidas da maneira que
quisessem.
Então, ouço vocês dois
condenando o sistema de cotas aprovado pelo STF, alegando que somos um pais missigenado,
fundamentando que um estudante branco
tirou nota nove no vestibular e um
estudante negro ou pardo, como queiram denominar, tirou apenas nota seis e este
ficou com a vaga. Isso é injusto, dizia
você, pois isso alimenta o racismo, os negros que estudem, se empenhem e procurem
tirar notas melhores para ter direito a estudar numa universidade. Até quando
vamos continuar sendo hipócritas e perversos com essas criaturas, caro comunicador?
Até quando? Faça o que fizer hoje, o
Brasil jamais conseguirá pagar, sequer, um
quinto de toda a dívida que temos com essas criaturas tão injustiçadas. Jamais a quitaremos.
Por
outro lado, uma nota não pode ser o único critério decisivo para medir a
capacidade de ninguém. Quantos alunos temos por aí, dedicados, estudiosos, assíduos, que no dia da prova não estão passando por um bom momento e tiram
notas baixas? Enquanto outros, que não são tão dedicados assim aos estudos, por
terem uma melhor condição de vida, alimentam-se melhor, moram em lugares
melhores, estudam em colégios melhores, tem professores mais qualificados,
memorizam melhor a matéria e tiram uma
nota melhor. Será que esse será o critário que resgatará as diferenças de
condições e e de equidade nessa concorrência ?
Mas, ainda existe um outro
aspecto tão grave quanto esses que relatei e que gostaria de ressaltar: a falta
de perspectiva e de esperança no futuro. Como pais pobres ou miseráveis vão conseguir
motivar seus filhos a estudar, sabendo que eles jamais irão conseguir entrar
numa universidade pública, concorrendo conforme esses princípios que
vocês tanto defenderam?
Muitos criticam e eu devo reconhecer
que o programa “Bolsa Família”, por exemplo, não é o ideal de justiça dos
sonhos, mas diante da emergência e da fome, apesar de algumas distorções, não
há como negar que ele está sendo de
fundamental importância para as camadas mais carentes da nossa sociedade.
O nosso sistema de cotas,
que felizmente foi mantido pelo nosso Supremo Tribunal Federal, que com isso, deu uma demonstraçõ inequívoca de que está mudando para melhor, não pode ficar a mercê de
interpretações de sofistas (1) que, apesar de partirem de premissas
verdadeiras, chegam a conclusões falsas, induzindo o povo a erro.
Espero, sinceramentre, que
vocês possam refletir melhor sobre esse
tema e se redimam diante dessa equivocada posição que demonstraram ter
durante o programa “ A verdade do Povo”, pois,
se queremos mesmo mudar essa sociedade para melhor, temos que começar a mudar todo o sistema tradicionalista
de acesso à educação, ainda que, para isso, tenhamos que, temporariamente, adotarmos
medidas emergenciais como estas, que certamente serão revogadas com o passar do tempo.
(1)
Em filosofia, “sofismo
é um raciocínio aparentemente válido,
mas inconclusivo, pois é contrário às próprias leis. Também são considerados
sofismas os raciocínios que partem de premissas verdadeiras ou verossímeis, mas
que são concluídos de uma forma inadmissível ou absurda. Por definição, o
sofisma tem o objetivo de dissimular uma ilusão de verdade, apresentando-a sob
esquemas que aparentam seguir as regras da lógica”.
Meu grande abraço, Edvaldo Cosmo.
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