A Transferência de culpa
Uma das maiores características do mundo
moderno é, sem dúvida, a diversidade de fé religiosa. De acordo com
David Barrett (1), o número de diferentes religiões cresceu de 1000, no
ano de 1900, para 10.500 hoje, e deve
chegar a 15.000 nos próximos 25 anos. Não
sei até que ponto isso seja positivo e contribui para o bem da humanidade, mas para mim seria um
ato de violência contra o direito à liberdade impor uma religião ao povo de uma maneira autoritária,
o que certamente não seria um bom caminho. Diante das ilusões e
desilusões individualmente vividas por
cada ser humano, a busca por uma das crenças religiosas existentes tem se tornado um refúgio consolador diante dos difíceis desafios que todos temos que
enfrentar ao longo da vida. A teoria que mais se impõe
é a de que precisamos mesmo acreditar
em alguma coisa. Precisamos escolher uma das teorias filosóficas e doutrinárias
que existem e fazer parte do
corpo de alguma entidade religiosa. Simplesmente aderir a uma delas, sem muitas contestações. Porque tudo nos leva a acreditar que religião é sinônimo de fé e o homem sem religião não existe e não consegue ser feliz, pois isolados não somos nada.
Sabemos que, desde os primórdios,
os
homens sempre se agregaram pelo
instinto de sobrevivência. Eles perceberam que juntando suas forças poderiam
superar os obstáculos com mais
facilidade. Não demorou muito e a criação de regras religiosas em função da boa convivência entre os membros do grupo tornou-se uma
realidade inevitável. É preciso ter fé e
fazer parte de um grupo para
definição de um padrão de comportamento entre todos aqueles que comunguem com mesmas ideias, devendo cada um cultivar e defender sempre as normas
doutrinárias de que se compõe a
estrutura da sua congregação. Mas, qual será exatamente a diferença entre o
homem que acredita nos valores pregados por uma religião e aqueles que a
consideram apenas um instrumento de
dominação social? Cada religião certamente tem uma resposta diferente para essa
questão. O que até certo ponto sabemos é que precisamos ser aceitos como parte de um todo para encontrar o
conforto no abrigo da convivência entre
os nossos semelhantes.
Em princípio, foram os fenômenos naturais, muitos ainda inexplicáveis para o incipiente conhecimento humano da época, que levaram a humanidade a direcionar seu olhar para o além. Afinal,
tudo o que acontecia na natureza e trazia
alguma consequência catastrófica para o
homem primitivo seria considerado um
castigo de deuses invisíveis, os quais, através de suas forças incontroláveis, exerceriam
uma espécie de vingança contra a desobediência dos homens. Buscava-se,
então, um culpado para aliviar a razão
de tanta ira dos poderosos deuses. Eram erupções vulcânicas, terremotos,
tsunamis, secas que danificavam as plantações. As colheitas de alimentos eram comumente destruidas por inundações. E, outras
vezes, tempestades causavam mortes e sofrimentos ao povo. Os ataques de animais
vorazes também faziam parte desse contexto medonho e cruel causado pela grande mãe natureza.
Surge, então, a idéia de
negociação. Para amenizar a ira dos deuses os homens passaram a cultuar e
praticar o sacrifício de animais. A própria Bíblia relata em seu texto que eram sacrificados diversos animais dentro dos templos sagrados. Segundo
as Escrituras, tudo era realizado por orientação do próprio Iavé, a fim de abrandar a sua ira. Além de Israel,
por exemplo, Babilônia, Grécia, Egito e Roma, entre muitos outros povos também
sacrificavam animais aos seus deuses em função de suas crenças religiosas. E ai
daqueles que ousassem contrariar essas regras.
“Todos os povos que praticavam sacrifícios com
sangue na antiguidade o faziam por um único motivo: a transferência de culpa.
Os deuses tribais só perdoavam as transgressões dos humanos se houvesse algum
tipo de pagamento de sangue. É onde foi consagrado o nome "bode
expiatório", onde um animal é morto e o sangue inocente derramado serve
como expiação para purificar os pecados do povo. Dessa forma, a culpa e
consequente punição era transferida ao animal, deixando o pecador livre.
Em povos onde animais não eram
suficientes para perdoar os pecados, seres humanos eram usados como sacrifícios
mais "eficientes". Os seres humanos usados como sacrifícios tinham
que ser inocentes, e "puros", ou seja, virgens, sem defeitos e não
contaminados pelo pecado. Muitas vezes, a purificação só era considerada completa
quando fosse bebido o sangue ou comido a carne oferecida em sacrifício. “
Pelo conteúdo do texto acima, que pode ser encontrado em qualquer
literatura que fale sobre o assunto, podemos perceber que, desde o princípio da
saga humana neste planeta, o homem
vincula a prática de sacrifícios físicos com o perdão dos seus erros. Criou-se, assim, um falso deus fisiologista que nos oferece benefícios com
uma mão, mas espera receber com a outra. A famosa concessão de indulgências também pode ser considerada uma atitude
fundada na teoria da transferência de culpa, onde o pecador sacrificava uma certa parte de seu patrimônio em troca do perdão de
algum pecado.
Para os humanos sempre foi impossível viver sem o pecado. O sentimento de
culpa pela prática de algum ato que infringisse alguma das normas ditadas
pelos líderes religiosos sempre culmiva na prática de sacrifícios como meio de libertação da angústia e da
tortura mental. Paradoxalmente, criou- se, então, dois deuses conflitantes entre si: de um
lado, um ser invisível quase tão poderoso quanto o Criador, que nos leva a sucumbir diante de suas terríveis tentações,
o que de certa forma representa uma transferência de culpa. Por nossa fraqueza, alimentamos a tese de que somos induzidos a cometer desatinos e agir no
sentido oposto às normas estabelecidas pelo Senhor porque somos tentados por uma
criatura perversa que pretende destruir
tudo aquilo que de bom o Senhor criou ao longo de bilhões de anos. E, do outro
lado, temos um deus que nos castiga severamente porque o traímos e o desobedecemos,
descumprimos os seus mandamentos. Vê-se
que, desde os primórdios, essa teoria bastante divulgada passou a ser a dialética
e o grande dilema implantado na mente humana. Esse pensamento de
transferência de culpa perdura até os dias atuais. Ainda existem muitas
religiões que defendem os sacrifícios como forma de expiação dos pecados da
humanidade.
Entre o povo judeu não era
diferente nos tempos de Jesus. De acordo
com a Bíblia, os sacrifícios e as oferendas
eram práticas tradicionalmente aceitas durante os eventos religiosos.
Ver ( 2 Cr 29.23,24 - Ed 6.20) ; ( Lv 14.10 a 21 - Nm
15.5 a 11 - 28.7 a 15) ; (Êx 22.20, e
12.5 - Lv 5.7 e 9.3,4) ; ( Jz 2.5 -
11.15 - 16.5 - 1 Rs 18.30). Como naturalmente acontece com cada família,
os filhos são educados e encaminhados conforme as crenças seguidas e orientadas
pelos pais. Sendo um legítimo judeu, Jesus aprendeu e assimilou, desde sua infância, os conceitos doutrinários impostos e
praticados pela dogmática da religião judaica. Confunde-se religião, educação e
cultura como forma híbrida dos valores
morais e éticos, fundamentais para a
convivência entre as pessoas e para a eternização
de suas almas.
Quer-me
parecer que a transferência de culpa contribuiu muito para a construção e
manutenção de uma sociedade hipócrita e
injusta. Todos sabemos que, quando em público, a grande maioria das pessoas costuma
se relacionar entre si representando seres
com aparências de perfeição e normalidade completamente diversos daqueles que realmente elas são. Confrontam a
sua natureza original e deveras omitem o
que verdadeiramente pensam para não
serem taxadas publicamente de pecadoras ou de coisa ainda pior. Contudo,
no âmbito de suas vidas privadas e introspectivas, todos sabemos que essas
pessoas agem de maneira muito diversa do
que aparentam e dizem ser. Por isso, muitos buscam o refúgio e o conforto das
palavras contidas nos textos religiosos
como uma espécie de fuga. Como se busca no bálsamo medicamentoso um alívio para
as suas dores.
Mas, ninguém consegue enganar ao Senhor. Todo
o universo é interligado e nenhuma folha
cairá sem o conhecimento do Todo-Poderoso. O homem permanece em ignorância espiritual
para não encarar a dura realidade: a de que estamos falhando diante da grande
oportunidade que nos foi concedida por Deus. Porque muitos se desviam do verdadeiro
caminho e esquecem de que um dia, para acabar
definitivamente com essa transferência de culpa e com esse permanente conflito
inserido na consciência de cada um, Cristo foi enviado como o Cordeiro de Deus
para nos trazer a libertação. Aquele que seria abatido em sacrifício definitivo e teria o seu sangue
derramado para por fim a todos os grilhões impostos pela culpa criada e mantida
pelos homens desde épocas remotas. Sem o sentimento de culpa, todos os
seguidores de Jesus poderiam, enfim,
viver e conviver livremente na plenitude
de sua natureza e serem felizes, sem ter que oferecer nada em troca
por isso, como os tradicionais sacrifícios de animais ou de pessoas por conta dos erros considerados pecaminosos.
Cristo veio, então, para ser o nosso libertador. O derradeiro e definitivo sacrifício
oferecido a Iavé. E Nele devemos depositar toda a nossa fé, para que possamos conviver em harmonia, seguindo
os seus ensinamentos sem temor e sem sentimentos de culpa ou de dívidas com o
passado.
“Na necessidade absoluta do
novo nascimento pela fé em Jesus Cristo
e pelo poder atuante do Espírito Santo e da Palavra de Deus, para tornar o
homem digno do reino dos céus.” ( Jo 3: 3-8 )
Portanto,
Cristo não deve ser considerado nem tratado como um simples profeta ou um
mestre como outro qualquer. Ele
representa uma ruptura com um passado repleto de mentiras e de fantasias criadas por homens possuídos pelo ambicioso instinto de dominação e de controle
social. O Jesus Cristo, no qual eu creio e defendo aqui, não é propriedade
privada de nenhuma facção religiosa, como muitos pensam e levam o povo a
acreditar, pois Ele mesmo disse que sempre estaria e estará presente entre nós.
Ele veio para ser o libertador das obsessões impostas
por algumas religiões dominadoras e
escravizantes, que sempre ajudaram a manter uma sociedade desigual e cheia de
iniquidades.
Muitos afirmam que o sofrimento humano é uma criação de Deus para punir a humanidade.
Contudo, muitos sofrem por causa do desejo de tocar uma
estrela no céu e não o podem. Desprezam a beleza da flor que brota bem
ao seu lado, sonhando com coisas impossíveis. Mas eu afirmo que ninguém foi
criado para sofrer. O sofrimento na verdade é uma consequência dos atos mal planejados
e praticados pelo próprio homem. Muitos fingem e falam de um falso deus, como forma de manutenção perpétua no
poder, mas um dia todos serão desmascarados e a verdade prevalecerá.
Não creio em potestades nessa
terra com capacidade suficiente de representação do Senhor Jesus Cristo ou em
qualquer forma de expiação dos pecados
cometidos em vidas passadas. Porque Jesus veio e prometeu que sempre estaria presente
entre nós, até o final dos tempos. Infelizmente, não há um só entre os que se dizem
cristãos que cumpra os ensinamentos deixados pelo Senhor. Mas, não há como
enganá-Lo. Os verdadeiros cristãos já
foram escolhidos desde o seu glorioso Sermão
da Montanha. Bem-aventurados serão todos aqueles que crerem e praticarem o que Ele ensinou. E não importa se
você acredita em Deus ou não, ou qual seja a sua religião. Não importa o
tamanho dos seus conhecimentos sobre as coisas de Deus. O que importa, em
verdade, é o que você faz com essas coisas. É o que você pratica em função de sua fé.
O verdadeiro reino de Deus não se compra nem
se vende, apenas se aponta o caminho. Gratuitamente. E não adianta procurar o
reino de Deus em lugares onde os seus olhos não são capazes de enxergar e nem
seus ouvidos conseguem escutar. Por isso, sugiro que procure primeiro o reino
de Deus dentro de você mesmo. Ele sempre
esteve aí, desde o princípio. Então, bem-aventurados sejam aqueles que conseguirem
encontrá-lo, o quanto antes.
“Vinde a
mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai
sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração;
e achareis descanso para a vossa alma. Porque o meu jugo é suave, e meu fardo é
leve." ( Mateus11: 28-30 ).Palavras
do Senhor.
FELIZ ANO
NOVO E MUITA PAZ PARA TODOS.
11. Boletim Internacional de Pesquisa Missionária, in www.edcleytonsouza.net/, pesquisado
em dezembro de 2012.
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