De luto, na luta.

                     O Brasil está de luto  por causa de mais uma tragédia que tirou a vida  e interrompeu os sonhos de dezenas de jovens,  no último final de semana.  A dor dos familiares  é tão profunda que  as palavras somem  porque simplesmete não   existe  nenhuma palavra em nenhum dicionário no mundo que seja  capaz de exprimir ou expressar   o  tamanho de um sofrimento tão avassalador. Nesse  momento tão difícil, não há como contabilizar o tamanho de uma tristeza e da melancolia  que chega a machucar o coração e ferir a nossa própria alma.   
                     Tristeza, melancolia e luto são diferentes maneiras  para  expressar sentimentos e dores   muito  parecidos.  Dizem que a tristeza é uma dor que sentimos  diante  de uma perda muito grande.  Ficamos tristes quando perdemos algo que tanto  amamos  e que tanto queremos que permaneça ao nosso lado para sempre. Na tristeza  conseguimos  identificar  claramente o motivo  e a causa  de nossa dor.  Apesar da  enorme sensação de perda,  resta-nos o consolo de  ainda  podemos  ver,  ouvir ou tocar aquilo que perdemos. Ao menos de longe.  Quando perdemos alguma coisa que consideramos muito importante para nós e  identificamos essa perda como sendo a causa  do  nosso sofrimento,  temos uma sensação  caracterizada como  tristeza.  
                    A melancolia também nos causa dor por conta de uma sensação de perda muito grande. Contudo, diferentemente da tristeza, na melancolia nós sofremos  por  razões não definidas. Naturalmente sentimos  uma estranha sensação de perda e sofremos por isso, mas   não  conseguimos identificar o objeto,  o motivo  que nos causa tamanha angústia.  Sentimos um profundo sentimento  diante da sensação de perda de algo muito querido,  e não conseguimos  saber o que seja exatamente. Uma imensa   melancolia  nos  envolve e nos afasta do mundo exterior  sem que haja uma  explicação  lógica para isso.
                     Já o luto é muito mais profundo, pois a dor é incomensurável.  O  luto se traduz num imenso sentimento de perda muito maior que na tristezab e na melancolia. Porque no luto nós conseguimos identificar com precisão  e com clareza a razão  que nos causa tanto sofrimento.  A sensação de uma  perda irreparável   nos leva a sucumbir diante de nssa impotência. O  luto se diferencia de uma simples  tristeza. Porque, apesar de conhecermos  o objeto ou o motivo  que nos causa  tamanha dor, infelizmente, no luto já   não podemos mais vê-lo nem ouvi-lo. Nem mesmo tocá-lo.  Assim, no luto há  uma dor que transborda os limites da razão e  fere a nossa própria   alma.  Como se pode perceber, no luto  a dor  é infinitamente maior que todas as dores que possamos sentir diante de uma perda inevitável. Porque não temos como reverter, como voltar atrás. Por isso o Brasil  ficou  de luto.      Porém,  por mais que estejamos  todos consternados  com o sentimento  de tristeza pelo qual os familiares das vítimas  estão passando nesse momento, jamais teremos a exata noção do tamanho da  ferida que se abriu no coração de cada  um deles. Ferida que nunca  mais cicatrizará.  A dor chega a ser tanta que a própria realidade torna-se um  pesadelo inaceitável.  Quem dera  agora adormecer para sonhar um sonho lindo e nunca mais acordar.
                        Não sou do tipo que gosta de escrever ou de falar  sobre tragédias como essa que ocorreu em Santa Maria. Talvez por estar envolvido emocionalmete com a dor dos outros, em momento como esses,  sinto-me fraquejar na hora de expressar o meu pensamento.  Mas, sei que é  impossível não se abalar  com o que aconteceu, principalmente da  maneira como  tudo aconteceu.  Por  mais que  tentemos ser fortes, criaturas superiores, nessas horas caímos debruçados diante de nossa fragilidade e  das  nossas próprias limitações.
                        Contudo, é importante  não se deixar  levar pela ilusão dos  caminhos  sem razão para não se perder diante das possibilidades. Normalmente, em momentos como esses, procuramos encontrar um sentido lógico para o que aconteceu, através dos seguintes questionamentos: se no local houvesse outras saídas...Se aquele teto não fosse feito com um material de fácil combustão....Se não tivessem acendido aquele  maldito sinalizador...Se não houvesse  excesso de  gente no inteior da boate...se o extintor  não tivesse falhado  na hora exata. Se de repente tudo não passasse de uma grande peça teatral, onde todos  deixassem de ser  personagens  de uma  encenação trágica  tão contundente  e no final  pudessem voltar  à vida  real.
                         Sei o quanto é difícil  aceitar a realidade.  Mas,  nesse momento é preciso cobrar as  responsabilidades de todos os envolvidos. É muito  importante tomar atitudes firmes para evitar que outras tragédias  como essas  voltem a acontecer.  Sabemos que houve  muita negligência e  muita imprudência  pra todo lado. Basta verificar  a conduta considerada como sendo negligente ou imprudente de acordo com a definição  da lei, de cada uma das partes envolvidas nesse episódio:  
                       O termo  negliegência  “origina-se do  latim negligentia, que se traduz em  desprezar, desatender, não cuidar. Exprime a desatenção, a falta de cuidado ou de precaução com que se executam certos atos, em virtude dos quais se manifestam resultados maus ou prejudicados, que não adviriam se mais atenciosamente ou com a devida precaução e prudência”.
          Já a imprudência “origina-se do latim imprudentia, que se traduz pela falta de atenção, imprevidência, descuido,  e tem sua significação integrada como intituto da  imprevisibilidade”.
                      De acordo com  Fernando Capez,  a imprudência: "Consiste na violação da regras de condutas ensinadas pela experiência. É o atuar sem precaução, precipitado, imponderado. Há sempre um comportamento positivo. É a chamada culpa in faciendo. Uma característica fundamental da imprudência é que nela a culpa se desenvolve paralelamente à ação. Deste modo, enquanto o agente pratica a conduta comissiva, vai ocorrendo simultaneamente a imprudência."
                    Infelizmente,    houve comprovação  suficiente de que não havia nenhuma condição legal ou estrutural para que aquele estabelecimento em forma de labirinto tivesse recebido autorização  para  continuar funcionando.  Por isso, as  únicas   dúvidas  que me perseguem  nesse instante estão presas  na minha e na garganta de muita gente. Se os órgãos públicos tivessem agido com mais responsabilidade e com mais rigor; Se  houvesse mais preocupação e mais cuidado com o povo; Se não houvesse tanta negligência, tanta falta de comprometimento dos gestores públicos com a vida das pessoas; Se não existisse tanta corrupção no Brasil; Se o  famoso e tradicional  “ jeitinho brasileiro”  não fizesse parte de nossa cultura; Se  não houvesse tanta certeza da impunidade. Quem sabe tudo isso  não  poderia ter  sido evitado. Quem sabe aqueles jovens teriam  retornado para suas casas, para suas famílias  e, completamente  exaustos de tanto  se divertirem, adormecessem com  a certeza de que suas vidas estariam sendo bem cuidadas por aqueles que assumiram o compromisso público  de zelar pela segurança de todos nós.    Por outro lado, se o homem  aprendesse com os  erros no passado. Se  a juventude confiasse mais na sabedoria  e na experiência dos mais velhos, quem sabe  deixariam de  se expor tanto,   frequentando lugares como  aqueles..
                 Porém,  encontrar  e punir os culpados  não  será suficiente para afastar  a  responsabilidade de toda a sociedade. Há tanta indiferença diante de  coisas  graves que tem acontecido,  há tanto tempo.  Ninguém olhava para aqueles jovens como gente, como irmãos, como filhos, como amigos, como  estudantes, como o futuro do nosso país.  Lamentavelmente, os governos cuidam muito mal dos nossos jovens.  Muitos comerciantes exercem suas atividades visando apenas o lucro. Nesse caso específico, eles exergaram a possibilidade de ganhar mais dinheiro e aqueles  jovens, como em tantos outros casos,  eram vistos  apenas como meros  consumidores aglomerados.  Os participantes da banda, chamada Gurizada Fandangueira,  que de gurizada  não têm nada, pois são  marmanjos rodados que deveriam  conhecer dos riscos de sua pirotecnia. Eles  também buscavam ganhar algum   dinheiro,  e  fazer  sucesso  com as apresentações,   sob o aplauso de  diversas  plateias.  
                    Agora, resta-nos, apenas, a vontade de  demonstrar a nossa solidariedade e dizer que também compartilhamos a dor daqueles que estão sofrendo  nesse momento  com a perda de seus entes queridos. Resta-nos a fé e a certeza de que tudo isso faz parte de um ciclo que ainda não somos capazes de compreender e nem de aceitar, mas que  a força do amor os confortará,  para que todos  possam encontrar a paz em seus corações, e prossigam com esperança no amanhã,  ao longo dessa difícil caminhada,  tão marcada pela saudade, daqui pra frente.   

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