O Progresso e o Sagrado

          Desde que o mundo é mundo que as religiões se impõem na vida e no cotidiano dos seres humanos. Elas agem  como  se fossem  paladinos  divinos  a dirigir  as relações  entre as pessoas nesta terra, servindo de fundamento a sua própria existência.  Desde os primórdios da  vida em sociedade que  as  religiões  procuram ditar normas de conduta, em função das crenças em um mundo sobrenatural. Na prática, o mundo real  em que vivemos deve sempre se  submeter  à vontade de seres invisíveis, vindos de outros mundo, os chamados  deuses, que fazem uso de homens especialmente escolhidos, ditos profetas religiosos,  para receber e  repassar dogmas  como condição unilateral válida  de regulação do comportamento humano.
       É comum a todas as religiões a definição  do que  deve ser considerado sagrado. De acordo com o dicionário,  sagrado é tudo o que for  inerente e dedicado a Deus, a uma divindade ou a um desígnio religioso. Sagrado para as religiões cristãs são, por exemplos, as Escrituras  Sagradas; as cerimônias e os objetos utilizados nos rituais, os templos,  o altar, o cálice onde são postos o vinho e a hóstia durante a consagração; a cidade santa de Jerusalém, etc. 
       Também são sagrados para o Candomblé, os Orixás, os terreiros, as danças em homenagens aos Orixás, o Mar de Iemanjá, os rios de Mamãe Oxum, etc. Ofender alguma dessas coisas consideradas sagrada pelas religiões é o mesmo que  cometer um sacrilégio, um crime que pode até ser punido com a morte, como é o caso do Islã, por exemplo, mesmo sendo a própria  vida  considerada um bem  sagrado.
      E, por falar em coisas sagradas, os rios também fazem parte dessa lista. Contudo, não há tanta reação quando são vilipendiados por alguém. Recentemente tivemos na cidade de Mariana, em Minas Gerais,  um grande impacto ambiental  que causou danos  irreparáveis à natureza sagrada do Rio Doce e das pessoas. Um rio que faz parte  da vida e do cotidiano de uma população distribuída ao longo de várias cidades. O rompimento da barragem da Mineradora Samarco, no último dia 5 de novembro,  causou um gravíssimo desastre ecológico, que matou e destruiu a vida de muita gente e de várias espécies. O rio agora está cheio de lama e  de substâncias tóxicas.
         A lama e as substâncias tóxicas  estão por toda parte e seguem lentamente  na direção do mar sagrado,  deixando para trás um rastro de destruição, de dor e sofrimento em várias famílias atingidas por essa catástrofe evitável. Várias pessoas morreram, perderam suas casas e muitas delas ainda estão desaparecidas. Um cenário triste e desolador, que nos causa revolta e ao mesmo tempo um profundo desejo de justiça, de punição severa aos responsáveis por essa tragédia previsível.
        Ora, se as águas dos rios e todas as suas biodiversidades são essenciais para a permanência da vida humana aqui na terra, também são sagrados. Mas, o homem os está destruindo em nome do progresso. A filosofia que manda é a do emprego e renda. Devasta-se tudo, destrói-se as florestas, polui-se todos os rios e  o quanto mais for  necessário ao progresso, tudo em nome do desenvolvimento, da produção de empregos e renda para o país. 
           Mas, se a natureza e os rios são  sagrados para as religiões, então por que há tanta indiferença com o que acontece? Cadê a indignação dos religiosos? Onde andam aqueles que defendem a fé?  Se o governo não faz nada, então que façam os que defendem as coisas sagradas em suas religiões. Que exijam o ressarcimento dos danos e recuperem o Rio Doce e toda as biodiversidades. Que os responsáveis respondam perante a Justiça pelos seus crimes. Ou será que fé também é sinônimo de covardia e eu não sabia? 
            Como se vê, o crime ambiental parece que compensa nesse país tão cheio de impunidades. Porque basta os criminosos apresentarem provas de que causaram todos  esses danos ambientais em função do desenvolvimento econômico, do progresso, da  criação de emprego e da produção de  renda  que os responsáveis  receberem apenas uma multa irrisória e o sagrado perdão do Estado e continuam avançando com suas máquinas de destruição em massa. 
      "Eu não sou contra o progresso, mas apelo para o bom senso". Canta de novo, Roberto.





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